O PESO DA TRADIÇÃO E DOS COSTUMES
Quando reencarnamos nesta esfera existencial, a bem dizer, já
encontramos o “circo” armado. Caberá a cada um de nós
readaptar-se ao mundo material procurando assumir e
desempenhar bem o seu papel. Gostemos ou não, concordemos
ou não, deveremos seguir uma moral dominante, com suas
peculiaridades. Essa moral nos é passada pela família e pela
escola, principalmente. Muita coisa não poderá ser
simplesmente contestada; poderemos até não assumir totalmente
as regras e convenções sociais, mas não nos jogarmos contra
elas, pois isso implicaria assumir uma conduta anti-social,
atraindo sobre nós os mecanismos de repressão, dos quais os
dois mais importantes são chamados de ideologia e aparato
policial. Se o primeiro não funciona para nos enquadrar no
sistema, o segundo é acionado e aí não é possível resistir sem
prejuízo de nossa liberdade e mesmo integridade física.
Apesar de nem sempre corretas, as regras e convenções sociais
existem para estabilizar a convivência social. Mal com elas, pior
sem elas. Por isso as mudanças na maneira de pensar e agir da
sociedade são lentas. O próprio instinto de conservação a faz
agir como se fosse um ser único, que teme mudanças pois elas
significam sair do imobilismo e enfrentar o novo, o
desconhecido. Por isso a tradição e os costumes têm um peso
considerável sobre o presente. No entanto, o progresso é uma
lei que atinge a tudo e a todos e, no que diz respeito à
sociedade, surge na forma de novas invenções que alteram o
comportamento geral – a informática, por exemplo - e na forma
de idéias que vão se imiscuindo no dia-a-dia das pessoas e
alterando o seu pensar e, conseqüentemente, o seu agir. Já
reparou como que o conceito espírita de reencarnação caiu no
domínio público e mesmo quando não é usado adequadamente é
uma saída pela tangente para alguns e explicação provisória para
outros? É o fermento levedando a massa.
Recentemente houve um fato histórico que alterou
profundamente a vida social: a II Guerra Mundial. Se seus
danos no campo material foram extremamente altos, não foram
menores no campo do pensamento, na forma de encarar a
realidade e a própria vida. A tradição e os costumes foram
postos em cheque, pois se não foram capazes de evitar um
conflito armado de tão grandes proporções é porque não são
bons. Assim pensavam os jovens que perderam seus pais na
guerra, as esposas que perderam seus maridos e as mães que
ficaram sem seus filhos. Isso explica porque a geração dos anos
50 e 60 foram tão contestadoras. Nesse contexto de checagem
dos costumes, também as religiões tradicionais foram
reavaliadas e como não puderam dar respostas continuaram em
declínio. Aí vemos os jovens dos anos 60 buscando um novo
estilo de vida, inspirando-se nas crenças orientais para se
relacionarem com a divindade; quebrando tabus ligados ao sexo
e criando as comunidades alternativas. Nada disso deu o
resultado esperado e a crise existencial coletiva apenas se
aprofundou deixando-nos a perplexidade como herança cultural,
com a qual os jovens de hoje ainda se debatem.
Isso explica porque a juventude passou a usar a droga, o fumo,
as bebidas alcoólicas, a delinqüência e o sexo como válvula de
escape para suas angústias. Nos anos 60 e 70, na América
Latina, a onda de golpes de Estado agravou ainda mais a
situação, pois gerou a alienação política e a defasagem cultural,
hoje motivo de tantas preocupações, pois nas mãos de quem
estarão esses países na entrada do século XXI? Estamos de
certa forma correndo atrás do prejuízo.
Por esses e outros motivos, a juventude se vê às voltas com uma
série de dificuldades que vão dos vícios socialmente aceitos,
como alcoolismo e tabagismo, até a vida sem objetivos e
conduta francamente anti-social. As drogas tornaram-se um
problema grave e até agora sem solução eficaz. A sociedade
atual mergulha no caos, devido a ausência de novos valores
estáveis, aprofundando a crise que é eminentemente de natureza
sócio-moral.
No curto prazo é preciso buscar uma solução para o crescente
consumo de drogas. Parece que a informação é um dos recursos
mais eficazes para se alcançar esse objetivo. Podemos dizer que
para todos os tipos de problemas a informação correta é útil. Os
jovens principalmente, devem informar-se sobre as drogas e
seus efeitos sobre o corpo e a mente, além de aprenderem a
dizer não quando lhes forem oferecidas. Criar o círculo vicioso
da droga é fácil, sair é que se torna difícil. Não há dúvida que o
efeito psicológico da droga é bom e é por isso que surge o vício.
O problema é que não resolve nossas angústias e seus efeitos
são passageiros, degrada a criatura, levando-a à exclusão social,
quando não a doenças graves de difícil recuperação, à morte ou
ao suicídio.
O homem, na verdade, usa drogas há milhares de anos, com
finalidades rituais e para estabelecer um contato maior com o
Mundo Espiritual, através de uma mediunidade passageira e
artificial, além de perigosa. Hoje, o uso de drogas tem outra
finalidade. Visa anestesiar a consciência, propiciar a fuga da
realidade e aos deveres. É um precipício à beira do qual vivem
milhões de criaturas humanas, ricos e pobres, cultos ou
iletrados. É um mal que alcançou todas as classes sociais e cada
vez atinge faixas etárias mais baixas.
É oportuno estabelecer a diferença entre hábito e vício para que
a compreensão do assunto se faça mais clara. Normalmente o
hábito é entendido como dependência psicológica e o vício
como dependência física. Todo vício já foi hábito. Uma coisa
conduz à outra. Flávio Gikovate, médico e psicoterapeuta a
quem já nos referimos em capítulo anterior, aponta aspectos
importantes sobre os efeitos das substâncias tóxicas mais
consumidas, os quais passamos a transcrever para maior
informação do leitor. Quanto ao álcool diz o seguinte: “Em
pequenas doses ele é discretamente euforizante para a maioria
das pessoas; se as doses aumentam, aumenta a moleza, a
tontura, e começa a vir uma grande sonolência. Um pequeno
grupo de pessoas, talvez dez a quinze por cento, tem uma
reação diferente: a partir da terceira dose de uma bebida forte
ficam eufóricas, muito excitadas e com disposição redobrada
(...). Aí a pessoa não é mais capaz de parar de beber; irá beber
horas a fio, até não agüentar mais, até cair, já perto do coma
alcoólico - estado de inconsciência que deriva da overdose de
álcool”. Segundo ele nos informa, o álcool produz dependência
psicológica após 2 a 5 anos de uso, e dependência física após
mais ou menos 15 ou 20 anos.
Quanto à maconha, é um assunto mais grave, pois é a droga
mais usada pelos adolescentes. “Seu efeito é, para a maioria das
pessoas, relaxante. A pessoa ri à toa, o cérebro não fica muito
esperto - às vezes ocorre o contrário: surgem idéias variadas,
rápidas e muito inteligentes - e ela se sente totalmente liberta
das responsabilidades. Talvez por isso a maconha tenha sido tão
bem-sucedida nos anos 60, quando a juventude
superconservadora tentava se adaptar aos novos padrões, à
liberdade sexual. (...). A memória fica muito prejudicada. A
pessoa não lembra o que pensou no instante anterior. Mesmo se
tem idéias geniais, elas “evaporam” com enorme rapidez”.
Provoca também perda de concentração, de atenção, sensação
de perda de controle interior, o pensamento se acelera e existem
registros de surtos de loucura sob o efeito da maconha.
A cocaína é cheirada na forma de pó ou injetada diretamente na
veia. “(...) tem um efeito fugaz. A excitação, a sensação de que
se é um gênio, com cérebro claro e brilhante - o que só a pessoa
acha, pois quem convive com ela vê apenas uma pessoa inquieta
e angustiada -, dura de 30 a 40 minutos e logo vem uma
tendência para a depressão. (...). O uso regular dessa droga
ainda é muito recente. Podemos, contudo, prever danos físicos
parecidos com os ligados ao uso da dexedrina: desgaste
prematuro do organismo e depressões graves, às vezes seguidas
de suicídio”.
“O crack é um derivado novo da cocaína, mais barato e
parecido em tudo com ela. É uma pasta branca, que se fuma em
um cachimbo pequeno - similar aos usados nos anos 60 para a
maconha -, e parece ser do agrado dos jovens. Provoca uma
tendência para a violência; libera a agressividade dos jovens, o
que não é nada bem-vindo. Até o momento, o crack está
claramente associado a grupos de delinqüentes, a gangues de
jovens que, depois de fumá-lo, saem para assaltar, estuprar,
atirar a esmo etc.” O autor alerta para os desastrosos efeitos
sobre os aspectos humano, afetivo e social dos toxicômanos. A
começar por se tornarem insuportáveis. Seu convívio só pode
ser tolerado por outro viciado. Como ele diz, o indivíduo tornase
um chato, no mais completo sentido da palavra, incapaz de
autocrítica. Toma atitudes ridículas e acha que está “abafando”.
Pelo que foi visto, a sociedade precisa de mudanças. Desde os
vícios socialmente aceitos e nem por isso menos danosos, até as
drogas usadas como processo de fuga de uma realidade que se
rejeita ou que simplesmente não se suporta, denotam uma
profunda carência de valores que ajudem a dar vazão às
angústias existenciais. Convém lembrar que ninguém vive sem
problemas. Precisamos aprender a lidar com eles, com o
sofrimento. Essas coisas estão entre os objetivos da vida. Até
uma certa dose de ansiedade é necessária para que prossigamos
na existência. A ansiedade em níveis toleráveis equivale a uma
mola propulsora que nos empurra para frente; nesse caso é
sinônimo de expectativa. Passa a ser um problema quando afeta
nosso modo de sentir e pensar e a interferir negativamente em
nossa capacidade de avaliar situações.
Que o leitor nos permita relembrar aqui que a vida não é uma
festa, e que a reencarnação na Terra não é feita com o objetivo
de fazermos algum tipo de turismo. Se o fosse, convenhamos, a
escolha demonstra um grande mau gosto. Nossa passagem pela
Terra visa, em termos genéricos, a reparação de erros do
passado (e não exatamente punição), a educação espiritual, a
aquisição de novas virtudes e a consolidação daquelas que já
tivermos obtido. Em suma, o fortalecimento dos dois aspectos
indispensáveis à nossa evolução: o desenvolvimento da
inteligência e dos princípios morais. Para atingirmos esses
objetivos, muitas vezes é necessário destruir valores antigos,
superar as inibições produzidas por costumes e tradições
obsoletos, que cumpriram seu papel na evolução social e que
hoje esgotaram-se. Destruir o velho é o preço que pagamos pela
obtenção do novo. A construção de uma nova sociedade exigirá
de cada um a superação dos condicionamentos individuais, das
limitações e imperfeições próprias de nossa posição evolutiva, e
a criação de novos valores sociais que venham a constituir uma
nova superestrutura, um novo campo de idéias. Isso já está
ocorrendo; é só observar em volta e veremos as preocupações
em torno do fim das guerras, como forma de resolver diferenças
entre as nações; as propostas em torno da estabilidade da vida
na Terra, isto é, a ecologia tornou-se uma questão política; e as
preocupações acerca do respeito aos direitos e garantias
individuais, com o fim do arbítrio, da repressão, das
intransigências devido a diferenças raciais, culturais, lingüísticas,
políticas etc. No crepúsculo do segundo milênio podemos ficar
otimistas, pois essa civilização dita cristã será substituída por
uma melhor, não há dúvida. É uma mera questão de tempo até
que as novas estruturas sociais se definam e cristalizem, de
modo a sustentar uma nova ordem política, econômica,
religiosa, científica e cultural.
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