ROSA VERMELHA
CARTA ABERTA N.º 4
MEU FILHO JAGUAR, SALVE DEUS! Esta carta tem um sentido mais profundo de amor, porque tudo começou de maneira mais original que já senti, vi e ouvi em toda a minha vida. Deus fez o homem para viver cem anos neste mundo e ser feliz no livre arbítrio, onde ninguém é de ninguém, na liberdade total da alma que aspira nas afinidades do sentimentalismo; onde o sol e a lua, a chuva e o vento, tão distintamente controlados afetam. Assumimos o compromisso de uma encarnação. Juntos partimos não só pelas dívidas em reajustes como também pelos prazeres que este planeta nos oferece. Sim, estando no espaço, devemos na Terra. Sentimo-nos desolados e inseguros, porque estamos ligados pelas vibrações contrárias. E neste exemplo, Jesus nos afirma que só reajustaremos por amor.
Tudo começou assim: Viajava para uma estação de águas e, na velocidade do carro, uma linda mulher, marcando mais ou menos dois anos de desencarnada, emparelhou ao meu lado e, como se estivéssemos parados, começou a contar a sua vida, que muito me impressionou pela maneira natural. Morava ela na cidadezinha por onde eu passara e amava perdidamente o seu esposo Antonê, como ela o chamava. “Porém, perdi a segurança e comecei a sofrer e a fazê-lo sofrer. Inimizei com toda a família. Passei a viver num suspense terrível. Se saíamos para uma festa e ele estivesse alegre e feliz eu começava a me torturar e acabava por manifestar qualquer mal, contanto que ele se sentisse infeliz. E, estando triste, eu começava, também, as minhas suspeitas. Olha, como martirizei a vida do meu pobre Antonê. Sim, de toda a família. Não tive filhos, porque filhos me separariam, não dariam tempo de correr atrás do meu marido. Pensava nos conselhos de minha sogra, conselhos tão queridos que me davam mais suspeitas, até que rompi com toda a família. Então Antonê começou a mentir-me. Um dia o vi conversando com uma moça que havia sido sua namorada. Fiz um escândalo terrível. Porém, desta vez, ele permaneceu numa atitude afirmativa e eu tive medo. Depois ele disse em tom firme: “De hoje em diante, irei todos os dias à casa de minha pobre mãezinha, que você destruiu. Você não me impedirá!” Sim, foi como se o mundo tivesse rodado para mim. Ele parecia outro homem. A sua personalidade que eu não conhecia.
Desde então, fui perdendo o controle. Já agora, sentia imenso o que havia perdido. Toda a minha arrogância, sem recursos para lutar, pois só temos força quando estamos na lei de auxílio, amando ou por missão, porém, não como eu, odiando. Comecei a sentir saudades do que havia perdido. Chegava perto dele e, apesar de sua tristeza, ele sempre me correspondia. Pensei em ter um filho, pois era o seu ideal. Fomos ao médico. Este, um velho conhecido, disse, com a intimidade que tínhamos, que um filho não encomendamos quando queremos. E, disse mais, pela minha expansão, falta de controle, eu havia me descontrolado e precisava de tratamento e religião. Saí dali pensando como recuperar o que estava perdido. Propus pedir perdão à minha sogra, porém ele advertiu-me que minhas cunhadas ainda estavam sentidas demais comigo. Não deveria, então, chegar até lá. Fiquei isolada, porém, ele sempre meigo e cavalheiro comigo. Realmente me amava, Tínhamos uma fazenda perto dali e ele, todos os dias, ia trabalhar sem a minha vigilância.
Fazia dois anos que eu havia me moderado, quando Antonê veio me pedir uma assinatura para vender uma fazenda. “Fazenda? Eu não a conheço. Como você comprou sem me dizer nada? Quem é que mora lá? Quem são as pessoas?” “Meu Deus! Não há ninguém!” - afirmava ele. “Vou lá antes de você vender!” “Não! Chega! - disse ele - Não suporto mais! E, quer saber? Não quero mais a sua assinatura!“ E foi saindo. Antenor, o nosso vaqueiro, contou-me tudo o que estava se passando: Emília, a professora e ex-namorada do meu marido, estava lecionando num fazenda vizinha, mas ela não era amante dele. Eles apenas se queixavam de suas infelicidades. “Porque se dirige a mim, D. Célia? Eu já vi o Sr. Antonê sair daqui chorando, muitas vezes, dizendo: Se eu não amasse tanto a Célia, um dia sairia daqui e não voltaria mais!...” “Chega! - gritei - Não quero mais ouvir!”
Antonê foi embora. Saí correndo até a casa da minha sogra. Porém, Deus não deixou que eu o fizesse sofrer mais: Uma camioneta me atropelou. Levaram-me para o hospital onde vim a falecer. Não falava, porém, via a todos: Minha sogra, meu marido e algumas cunhadas. Meu marido chorava com resignação. O padre veio e deu-me e extrema-unção. Foi só o que me lembrei. E, por muitos anos, fiquei a vagar, sempre me lembrando das palavras da extrema-unção: ressuscitar os mortos! Então tinha medo de me afastar do cemitério e perder a oportunidade. Não encontrei nenhum morto que fosse meu conhecido, apenas um ÍNDIO, insistindo para que eu deixasse meu marido, enfim que eu abandonasse o meu mundo, aquela cidade onde era tudo para mim, onde eu ainda tinha esperanças.
Todos os dias, pela madrugada, um silvo muito grande nos despertava e eu ficava na expectativa da ressurreição. Como seria, se eu não conhecia nada que pudesse acreditar? Porém, a minha mente estava tão habituada a crer nas minhas calúnias. Naturalmente, foi o fenômeno habitual. Este silvo vinha de um lindo homem vestido como um CENTURIÃO ROMANO, acompanhado de uma linda mulher, também romana. Diziam coisas lindas, levavam pessoas com eles, porém, somente eu não me convencia. Um dia, chegou um enterro. Pensei: Quem seria? Sete dias depois do enterro, chegou Lazinha, uma mulher que se havia perdido e sempre estava presente. Nós nos vimos e eu quis fugir, como sempre. Ela, porém, falou: “Célia! Aqui também? Este é o mundo em que não pode existir orgulho!” E, com o mesmo cinismo, desafiava-me com o olhar. Novamente, começou a contar o que havia sucedido: “Antonê viajou. Inácio, seu cunhado, quase matou Zeca, chofer da camioneta que te matou!” Depois, arrematando, disse: “Sabe, vou embora daqui. Sim, uma coisa muito falada na cidade: Ninguém foi ao seu enterro!” Sim, pensei - no entanto, no seu Lazinha, foi tanta gente! “Ah! - disse ela - graças a deus! Nunca infernizei a vida de ninguém, nem nunca levantei calúnia a ninguém. Nem mesmo condenei Fulgêncio, que me desonrou. Meus pais me puseram para fora da fazenda. Sofri, porém, não condenei ninguém. Hoje estão arrependidos e eu me saí bem com todos. Agora vou me embora!...” “Para onde?” - perguntei. Nisto, um ÍNDIO, que se dizia chamar TUCURUY, foi levando-a pela mão.
Comecei a gritar: Ressurreição, ressurreição!... Não há ressurreição! Não para mim, uma cínica como eu! Oh!, meu Deus! Como pude viver acusando e caluniando as pessoas. O que fiz! Nisto, vi ao longe, lá na sepultura, Emília e Antonê, ajoelhados, colocando uma rosa vermelha na sepultura, dizendo algumas palavras. Fiquei onde estava e, pela primeira vez, senti-me aliviada. Emília, a quem tanto caluniei... Logo que saíram, corri para lá e abracei a minha rosa, a última esperança na Terra, pedindo a Deus por Emília e Antonê.
Nada me levaria à ressurreição. Esta rosa é minha última esperança de um perdão. Se Emília me perdoa, todo mundo me perdoará! Fiquei ali extasiada, não sei por quanto tempo, até que TUCURUY, o mesmo índio que levou Lazinha, me entregou à senhora, Tia Neiva.”
Meus filhos, eu então, me lembrei do que ensino: A MINHA MISSÃO É O MEU SACERDÓCIO. Mesmo naquela viagem de estação de águas eu era a mesma sacerdotisa dos templos. Encaminhei-a com amor. E com o mesmo amor que entreguei meus olhos, que somente Jesus é testemunha, se, por vaidade, eu me afastar um dia. CARINHOSAMENTE, A MÃE EM CRISTO. (Tia Neiva, 9.10.77)
(TIA NEIVA, 4.9.77).
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