CAPITULO III
Salve Deus!
Meu filho Jaguar:
Não estamos preocupados com os velhos documentos das velhas
escrituras, porém estamos sim, desejosos de saber onde os nossos
antepassados encontraram tanta força e tanta coragem para chegar até
aqui. Sim meus filhos, o Missionário tem, graça a Deus, a sua energia e
toda harmonia nos três reinos de sua natureza. Muitas vezes contando,
até pensamos ser irreal o que nos dizem sobre os escravos e seus
Missionários.
Vejam filhos, estavam em festa, quando alguém anunciou que os
Ferreiras já haviam cercado Congá e que queriam Juremá a todo custo. Pai
Zé Pedro, mais evoluído do que Pai João, foi tentando segurar o povo
dentro do Congá e qual não foi sua surpresa, os crioulos novatos já haviam
saído de dentro de casa e como loucos açoitavam os Ferreiras, fazendo-se
ouvir pragas, ameaças e gemidos! O feitor que estava do lado dos Ferreiras,
sentindo que estava perdendo gritou:
- Sou o feitor desta Fazenda. Estes Nagôs imundos estão me
assassinando. Socorro!
Só se ouvia o urro do feitor, pois na escuridão daquela noite, fora
atingido na coluna ficando inerte no chão, gritando como um louco. Pai Zé
Pedro foi até o terreiro onde estava a briga e logo viu que a feitor estava
aleijado para sempre.
- Oh meu Deus! (gritou Pai Zé Pedro). Como poderemos assumir
tal dívida com este pobre irmão? Nisto, alguém que ouvia gritou:
- Eu acho muito bom que ele nunca mais caminhe, para não
chicotear os outros.
- Meus Deus, meu Deus! (dizia Pai Zé Pedro andando de um
lado para outro). Oh meu Deus! Este pobre homem que não vai nunca
mais andar... Caminhando, deparou com um outro triste quadro. Efigênia,
uma jovem negra estava ali também com o crânio aberto de pancadas. Era
filha de Júlia, uma paralítica. Zé Pedro não resistiu e foi buscar o seu
Sinhozinho. Sim, nenhum dos Ferreira havia morrido e quis a vontade de
Deus, nem mesmo ferido. Foi então que um dos quarenta que ainda não
havia se manifestado, deu um urro e se manifestou dizendo: - Salve Deus!
O sol já começava a esquentar seus raios, então o Nagô Pai Jerônimo
disse:
- Levanta acampamento, leva Jurema e Juremá. Escolhe o teu
povo e segue rumo á cachoeira do jaguar, que desemboca nas águas grandes
do mar. Nós, os Nagôs ficamos. Vamos buscar a desditosa mãe destas
gêmeas (disse apontando para Jurema e Juremá).
- Não! Eu não permitirei ( gritou Zé Pedro).
- Como? (disse Pai Jerônimo). Como se atreve a duvidar de teu
irmão?Vão embora que eu a levo. Se demorarem terão mais mortes. Vamos,
vamos logo. E desencorporou. Salve Deus. Zé Pedro e Pai João não esperaram
mais. Não se sabe como, juntaram suas coisas ajudados pelo Sinhozinho e
partiram dali. Só no caminho notaram que não faltava, ninguém e, inclusive
o feitor lá estava, numa cama de varas. O Sinhozinho e a Sinhazinha
despediram-se com amor. Quando já iam longe ouviu-se um forte
estampido. Era um tiro de cravinote.
Os negros do terreiro, que já estavam de volta e o Sinhozinho com
sua família, com a ajuda dos escravos que ficaram, enterraram os mortos e
seguiram para a cidade onde moravam seus pais. Enquanto os crioulos
contavam 108, faltando Jerônimo que ninguém sabia do paradeiro. Já era
noite quando chegaram á cachoeira do Jaguar. A lua cheia clareava as
matas e o mar, as palmeiras balançando suas folhas como uma prece. Pai
Zé Pedro sentando em uma pedra descortinava todo quadro por onde
teria que passar com aquela gente.
Pai João e os dois começaram a fazer os seus projetos.
- Sim, (diziam) tudo pela condenação da matéria. A terra...a terra.
(dizia Pai João) tão lindo o mar, no entanto a Terra, (disse Pai João) tão lindo o
mar, no entanto a Terra é o que nos pertence, por ser a parte sólida deste
planeta. Porém o que me conforta é que as forças cósmicas continuam em
atividade, porque neste universo não há inércia, tudo se movimenta em nosso
favor pela bênção de Deus. A sua atividade é essencialmente produtora desta
nossa matéria orgânica e inorgânica logo nos dará novas forças, graças a Deus!
Pai Zé Pedro que só ouvia, disse sorrindo.
- Onde aprendeste tanto? Isto não são palavras de Nagô!
- Estou consolado a mim mesmo, Pedro.
- Porque não pede ao Mestre Agripino? Ele é quem me consola.
(Foi quando os dois começaram a receber energia).
- Sim Zé Pedro, a atividade do homem é essencialmente produtora
e as forças essencialmente ativas. Como já disse, cria na matéria orgânica
este arsenal de forças, portanto temos que organizar um ritual, uma jornada,
vestimentas que mudem a sintonia dos crioulos.
- Sim Zé Pedro, vamos erguer esta arma para o Céu.
- Sim João, é realmente um arsenal. Oh Meu Deus!.
E olhando a paisagem do lugar disseram – Faremos uma jornada
em frente a Cachoeira, enfeitaremos as crioulas e faremos lindas princesas
dos castelos encantados que já ouviu contar.
- E eu que pensei que você meu irmão, era um simples escravo!
- Sim (disse Pai João), tenho Agripino que vem nos meus sonhos
e me conta tudo.
- Eu também tenho um Índio que me falava quando eu ia entrar
no chicote do feitor. Riram, riram muito, de repente lembra do feitor.
- Meu Deus! O que vamos fazer com este pobre homem? De
repente ouviram um grito. Era Jerônimo gritando, como se estivesse
perseguido.
- Oh meu Deus! Nossa vida não tem fim. E os dois continuaram
a sorrir.
- Sim, e o ritual? (perguntou um).
- Faremos! (disse o outro) precisamos de energia para obter as
curas desobsessiva. Salve Deus! Faremos tudo que Deus nos aprouver.
Os gritos continuavam e todos á vinham ao encontro dos dois.
Salve Deus! Meu filho Jaguar. Domingo vindouro lhe darei a
continuação.
Com carinho
A mãe em Cristo.
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